sexta-feira, 7 de maio de 2010

Clarice viva, apesar dos pesares.


Clarice queria mais, queria ser realista. E ser realista era ver que estar comigo não valia a pena. Talvez por isso Clarice fizesse parte de um mundo diferente do meu e seu mundo me rejeitava, ou ela estava me rejeitando só eu não queria acreditar. Porque acreditar seria deixar Clarice ir embora, deixar o apartamento, os planos de estar-pra-sempre-juntos e eu, que era a única ligação com tudo de ruim que ainda restava na vida de Clarice.

E ela queria deixar para trás tudo de ruim que a cercava e era por isso que ela, sem pensar pra não dar espaço pra culpa ou duvida, me tirava da sua vida de forma bruta, cortava nossos laços como quem corta qualquer papel velho e inútil pra ficar menor e mais fácil para se jogar no lixo. Clarice estava jogando nossa vida a dois no lixo.

Clarice jogou tudo no lixo.

Confesso que fiz de tudo pra manter Clarice viva, continuei sem deixar cuecas no chão, os dois pratos na mesa, as duas tolhas no banheiro, o espaço vazio na cama, o porta-retrato na mesinha de centro, as chaves debaixo do tapete e o ‘Bom dia, amor’. Assim era uma forma de sentir Clarice presente.

As lembranças de Clarice me faziam uma companhia em todos os dias, nas noites de frio abraçava sua lembrança como quem agarra a ultima chance de calor humano. E era isso que me manteve quente sem Clarice por perto.

Ao acordar sussurrava ao vento “Bom Dia, amor” acreditando que Clarice pudesse ouvir, ou pelo menos sentir minha presença, o meu amor que era dela mesmo longe.

Clarice estava presente em cada parte da casa, no banco na beira da janela em que ela sentava pensativa pra fumar os cigarros de filtro branco, na rede da varanda onde eu abraçada nela dava gargalhadas estridentes das nossas conversas sem sentido.

Na verdade Clarice era a única que me entendia sem necessidade de grandes explicações, esclarecimentos ou qualquer coisa do tipo. Com Clarice não era necessário nada explicar, ela simplesmente me compreendia. Clarice era doce e firme em suas palavras e pensamentos, não julgava ninguém e não gostava de ser julgada. Por isso tinha ânsia de liberdade, de libertação de todos os rótulos.

Clarice me fazia um bem enorme e era nesse fato que me apegava para continuar uma vida de solidão a dois. Esperando um dia acordar e ter alguma noticia de Clarice para enfim pergunta-la o motivo dessa distância, de deixar esse vazio no meu peito e agradecer de deixar o meu amor por ela, porque era esse amor que manteve Clarice viva em mim. E ela estava viva como meu amor por ela.

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